16 NOVEMBRO | 14H30 | SALA MAGNA DA FACULDADE DE BELAS ARTES DO PORTO

CONFERÊNCIA: UNFRAMING ARCHIVES

Andrzej Marzec | Catarina Mourão | Efrén Cuevas | Fernanda Fragateiro

 

A arte – e a arte da imagem em particular – tem encontrado no arquivo desafios que o reforçam como território instável, de limite e fronteira impermanente. Quais as premissas subjacentes à constituição do arquivo na contemporaneidade? Como nos colocamos perante o arquivo pessoal e institucional? Estas são algumas das questões que têm fundamentado a realização de encontros e reflexões no festival de cinema Family Film Project, cujo enfoque principal são os filmes de arquivo, memória e etnografia. Estas dimensões têm-se revelado cada vez mais desafiantes, quer pela instabilidade que geram nos géneros (documentário, ficção, etc.), quer pelo questionamento que suscitam em torno da intimidade enquanto fundamento ontológico de uma paisagem cinematográfica. Com a proliferação crescente de registos de imagens pessoais e emergentes, somos colocados no centro de uma discussão ética, estética e política de um arquivo da intimidade que traduz a era panótica em que vivemos. Ao mesmo tempo que o arquivo é discutido na sua materialidade e nos seus destinos, debatem-se também as questões da imaterialidade na construção de uma memória ou identidade. Unframing Archive, colóquio inserido na 6ª edição do Family Film Project, dá continuidade à discussão sobre o ilimitado dos quadros e enquadramentos cinematográficos, propondo uma reflexão sobre as linhas orientadores de um arquivo múltiplo e aberto para o qual os artistas têm vindo a dar um contributo radical.

Organização: Family Film Project e Grupo de Investigação Estética, Política e Conhecimento do Instituto de Filosofia da Universidade do Porto

Andrzej Marzec

Fragmentos, vestígios e a maldição do arquivo - da nostalgia da found footage à materialidade da glitch art

Porque estará a cultura de hoje profundamente associada ao passado e focada nos seus próprios vestígios, que surpreendentemente rapidamente representam o principal campo de interesse dos seus criadores? Gostaria de explorar esta questão, aproveitando o quasi-conceito de "espectro" de Jacques Derrida para interpretar o trabalho artístico de found footage de Bill Morrison e outros artistas fascinados pela força de desintegração excepcionalmente criativa e produtiva. Este interessante género cinematográfico, olhando eternamente no abismo dos recursos arquivísticos, não só traz à luz os traços de uma realidade que há muito deixou de existir. Ele também inspira um profundo sentimento de nostalgia nos seus espectadores e aponta para a desvanecente presença do passado no presente, mas acima de tudo, fetichiza os restos. Também tentarei caracterizar o fenómeno ainda fresco e recente da estética pós-digital. Gostaria de responder à pergunta: porque será que os artistas pós-digitais geralmente realizam ações de destruição, usam imperfeições, distorções e erros. Olhando para o trabalho dos criadores de arte da falha, usando ferramentas teóricas de Rosa Menkman e Michael Betancourt, gostaria de mostrar o motivo do retorno ao analógico na era pós-digital e focar no potencial crítico de usar falhas na arte contemporânea. O fenómeno da falha talvez dê o melhor exemplo da nossa condição pós-digital, mostra a experiência descontínua da realidade e apresenta o uso contemporâneo do arquivo.

 

Andrzej Marzec (bio) 

PhD, professor do Instituto de Filosofia da Universidade Adam Mickiewicz em Poznań, Polónia.

Catarina Mourão

Poesia na Burocracia

Os arquivos e os documentos nem sempre nos contam uma história susceptivel de ser objectificada e comprovada. A verdade dos arquivos é também uma verdade construída e subjectiva. Através da análise de duas cenas do meu ultimo filme “A toca do Lobo” gostaria de propor uma forma mais poética e subjetiva de tratar o arquivo que na minha opinião pode nos encaminhar para um conhecimento mais desenvolvido e rico da nossa história pessoal e colectiva. Neste processo de apropriação do arquivo há como que um diálogo passível de ser explorado entre burocracia e poesia. Este processo implica a transformação do arquivo num novo arquivo, também ele susceptivel de ser tratado no futuro. Foucault comparava o arquivo a um céu estrelado onde algumas estrelas brilham mais do que outras independentemente da sua proximidade da Terra. Da nossa perspectiva olhamos o céu e criamos relações entre as estrelas que nos permitem dar sentido e uma ordem a algo à partida arbitrário. Com o arquivo poderá passar-se o mesmo.

 

Catarina Mourão (bio)

Estudou Música, Direito e Cinema (Mestrado na Universidade de Bristol e Doutoramento pela Universidade de Edimburgo, bolseira da FCT em ambos). Fundadora da AporDOC (Associação pelo Documentário Português). Dá aulas de Cinema e Documentário desde 1998 em diferentes Licenciaturas e Mestrados. Em 2000 cria com Catarina Alves Costa a Laranja Azul, produtora independente de cinema. É neste contexto que realiza os seus filmes que têm sido sempre premiados e exibidos em festivais internacionais. O seu último filme “A toca do Lobo” realizado no âmbito do doutoramento estreou comercialmente em várias salas do país.  As suas áreas principais de investigação são documentário; memória; sonho; arquivo; e autobiografia no cinema. Presentemente é docente na área de realização documental no Mestrado de Comunicação Audiovisual na ESMAE, Porto.

Efrén Cuevas

O arquivo doméstico em documentários microhistóricos

A minha apresentação abordará o estudo de um tipo específico de documentários históricos que eu rotulei como "microhistóricos", que geralmente dependem de fontes domésticas – home movies e instantâneos - como seu principal arquivo visual. Referir-me-ei a esses arquivos nos seus vários formatos, desde películas a vídeos digitais. Analisarei os diferentes usos deste tipo de arquivos, que podem ser resumidos em três: naturalização, contraste e historicização. Estudarei esses usos em duas variações de documentários microhistóricos: os que oferecem retratos coletivos e aqueles com abordagens autobiográficas, com foco em narrativas familiares.

 

Efrén Cuevas (bio)

Professor Associado na Escola de Comunicação da Universidade de Navarra. M.A. (Estudos de Cinema), Tisch School of Arts, Universidade de Nova York. Ph.D. Universidade de Navarra. Fez curtos períodos de pesquisa na Anthology Film Archives (2000 e 2001), na Universidade de Nova York (2005), na Universidade de Toronto (2016), e no ano passado foi investigador convidado na Universidade de Columbia (2016-2017). Autor do livro Elia Kazan (2000). Co-editor dos livros The Man without the Movie Camera: The Cinema of Alan Berliner (2002), Landscapes of the Self: The Cinema of Ross McElwee (2008). Editor do livro La casa abierta. El cine doméstico y sus reciclajes ​​contemporáneos (2010). Publicou artigos em revistas como Biography, Studies in Documentary Film, Cahiers d'Études Romanes, Archivos de la Filmoteca, ZER ou Secuencias. As suas principais áreas de pesquisa são: home movies, documentários autobiográficos e memórias de família; narratologia de filmes; realismo e representação no cinema e na TV.

Fernanda Fragateiro

Laboratório de Materiais

Desenhos, textos, livros, amostras de materiais, provas de cor, testes de escala, organizados em caixas, como num laboratório ou arquivo, apresentam-se como obra, revelando os processos de criação e tornando-os acessíveis ao espectador.

 

Fernanda Fragateiro (bio)

Operando no campo da tridimensionalidade, desafiando relações de tensão entre a arquitectura e a escultura, a obra de Fernanda Fragateiro (Montijo,1962) potencia relações com o lugar, convocando o espectador para uma posição de performatividade. Alguns dos seus projectos resultaram de colaborações com outros artistas plásticos, arquitectos, arquitectos paisagistas e performers. Fernanda Fragateiro expôs no Museu de Arte, Arquitectura e Tecnologia (Lisboa, 2017) Galleria Nazionale d’Arte Moderna e Contemporanea de Roma (2017), na Fundação Eugénio de Almeida (Évora, 2017, 2015), Palm Springs Art Museum (2016), Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa, 2016, 2012, 2004; Paris, 2013; Londres, 2013), CaixaForum (Barcelona, 2016, 2004), Orlando Museum of Art (2015), Palais des Beaux-Arts de Paris (2015), Carpenter Center for the Visual Arts, Harvard University (Cambridge, 2015), Krannert Art Museum (Champaign, 2015), CIFO Art Space (Miami, 2014), Bronx Museum (Nova Iorque, 2014), Mitxelena Kulturunea (San Sebastian, 2014), MUAC Museo Universitario Arte Contemporáneo (Cidade do México, 2014), Dublin Contemporary (2011), Trienal de Arquitectura de Lisboa (2010) Institut Valencià d'Art Modern (Valencia, 2008); Centro Cultural de Belém (Lisboa, 2007); Centro Galego de Arte Contemporánea (Santiago de Compostela, 2006), Fundação de Serralves (Porto, 2005), Culturgest (Lisboa, 2003). A sua obra está representada em várias colecções públicas e privadas, entre as quais: The Ella Fontanals Cisneros Collection, Miami; Fundación Neme, Bogotá; Fundação de Serralves, Porto; Fundação EDP, Lisbon, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisbon; António Cachola Collection, Elvas, Berardo Museum Collection, Lisbon; Caixa Geral de Depósitos Contemporary Art Collection, Lisbon; Centro Galego de Arte Contemporanea, Santiago de Compostela; Museo Nacional Centro de Arte Reina Sofía, Madrid; Marcelino Botín Foundation, Santander; La Caixa Foundation, Barcelona; Fundación Helga de Alvear, Cáceres.