OURS IS THE WASTELAND
MÁRIO VELOSO
À noite, uma voz invoca a memória fugaz de uma canção. O que existe no presente de uma memória que se refere ao passado? Que correspondentes visuais encontro? Fora da Bouça nasce de uma tentativa de um sem lugar e sem tempo em que uma memória, individual e coletiva, se ergue como um fio ténue que une os fragmentos de uma imagem. O formalismo dos quadros embate com o real do som – uma tentativa de representação que se encontra com a voz de uma canção popular. Tudo resulta de um desejo de plasticidade que desenha uma mise-en-scène que progressivamente se torna mais consciente de si própria. No início, há objetos em espaços desconexos. Os objetos enfrentam elementos naturais – um espelho mostra o fogo, tecidos e fotografias agitam- -se com a brisa. Nasce uma atmosfera misteriosa e impenetrável ligada à própria condição das palavras e do ato de reminiscência. No final, resta o cinema: desvenda-se o segredo, a impossibilidade de aceder verdadeiramente a esse outro tempo – a implacável lucidez de que tudo é falso e tudo é construção. É, enfim, um filme que procura registar a materialidade das coisas presentes à luz de um passado que vai fugindo. É uma peça que se encerra na sua qualidade de tentativa e experimentação, que se apresenta como uma procura e termina com a consciência da impossibilidade de encontrar uma solução definitiva.
Mário Veloso nasceu em Braga, no dia 17 de março de 1998. Depois de uma breve passagem pela Faculdade de Belas Artes da Universidade do Porto, formou-se em realização na Escola Superior de Teatro e Cinema. O seu primeiro filme, Rio Torto (2019), documentário realizado em contexto académico, foi galardoado com os prémios Fernando Lopes para Melhor Primeiro Filme Português e Pedro Fortes para Melhor Filme Português dos Verdes Anos, na 17.ª edição do DocLisboa – Festival Internacional de Cinema.